Blog do Professor César Renato


Depois de algum tempo inativo, e pela disposição e necessidade de estabelecer novamente um canal de comunicação com meus interlocutores externos, este blog volta ao ar.
Nele pretendo, dentro do possível, semanalmente discorrer sobre algumas questões que julgo importantes e que percorrem minhas comunidades em alguma medida, tanto no micro-espaço que me situo, quanto no macro-espaço social onde estamos todos.
Quem pretendo alcançar são aqueles que estou mais perto, como família, especialmente meus filhos, amigos, alunos e colegas em geral. Minhas colocações buscam alcançar meu ponto de vista sobre temas que acredito serem pertinentes a discussão.

sexta-feira, julho 04, 2014

Copa do Mundo do Brasil 2014 – Quem ganha, quem perde? Ganha de quem, perde pra quem?#copaseparanaoune

Eis que Copa da Fifa continua, eis que mais uma vez estou aqui pra refletir com cada um dos que me leem. Mas antes quero contar-lhes algo que me aconteceu hoje, pela manhã, no supermercado. Creio que depois de lerem meu texto conseguirão entender um pouco mais, porque isso aconteceu!
Eu comprava limão, na “feira” do supermercado. Escolhia entre os que mais brilhavam (assim me ensinou meu pai, quando ainda era pequeno). Esse é um aprendizado que me foi dado pela tradição. Uma cultura popular que tanto defendo em meus textos. De repente, não mais que de repente, uma mulher ao lado me chama. Ela parecia escolher bananas, e me pergunta – Moço vocês vão colocar mais bananas aqui? Certamente pensou que eu era funcionário do supermercado, muito embora estivesse com uma camisa de time de futebol, bermuda e alpargatas(veja, eu com uma camisa de time de futebol lá, e agora aqui, sem assistir a Copa da Fifa!!! Mas já expliquei isso.) Antes que eu dissesse a ela que não trabalhava ali, ela mesmo disse-me – Opa, desculpe, pensei que fosse alguém do mercado. Antes ainda que eu respondesse, ela virou-se para uma moça, que certamente era funcionária, porque vestia-se com uniforme, e esbravejou a ela – Heiii, não vão repor bananas ali não!!!! (Isso mesmo, de modo grotesco e imperativo) Meu filho, que estava comigo chegou a sair de perto, indignado com a forma como tratou a menina. Mas esse não é o núcleo da história que quero contar, o mais bestial, a maior aberração, o ridículo vem agora. Depois que a moça respondeu-lhe, a tal mulher virou pra mim e falou-me: Desculpa moço, não é que você tenha cara de "pobre", é que me enganei mesmo!!!!! Tem ideia do que há na cabeça de um ser desses? Minimamente, ela, vestida com roufenhas da moda, e fazendo compras no mercado é, na opinião dela, “rica” e o trabalhador do mercado, quem quer que seja ele, é o “pobre”. Não acha isso sinistro? não te dá ânsia? Em mim deu. Olhei pra ela e só pude expressar uma reação. Ri, gargalhei, tive pena e fui embora! Queria sair de perto deste ser!
Guarde essa historinha. No final do texto quero que a use para refletir comigo!
O Argumento que quero dividir neste texto hoje é o seguinte: Quem ganha com um evento como a Copa da Fifa? Quem perde? Para isso pretendo estabelecer três perspectivas. O ganho econômico, o ganho político, e o ganho social. E dividir em cada uma delas, organizações produtivas, políticos e a sociedade em geral.
Tenho caracterizado desde o início dessas reflexões sobre a Copa da Fifa, a Fifa como uma organização econômica. Na escolha socioeconômica que fizemos na modernidade, o “ganho” econômico, sobrepõe e praticamente elimina, todo e qualquer outro ganho. As organizações econômicas vivem pelo lucro, que chamei de ganho, e pela acumulação de capital. De modo direto e objetivo, exclusivamente para isso!
Para ganhar dessa forma a organização econômica tem necessariamente que agir a partir de duas premissas fundamentais, que tratam (1) da exploração dos meios de produção de forma racional e burocrática, evitando qualquer tipo de majoração de custos financeiros; e (2) da garantia do consumo intensivo de tudo que produzem massivamente, pois quanto maior a produção, maior a venda, maior o ganho.
Nesse caso, os meios de produção podem ser divididos em três grandes grupos, quais sejam, a propriedade privada de locais, instalações e equipamentos; o capital investido para a produção; e a força de trabalho humana, necessária para o manuseio da maquinaria e do capital.
Quanto a propriedade privada, há séculos um grupo seleto e diminuto de pessoas tem se apropriado dela, pois são eles que investem na produção. O trabalhador comum não tem recursos para tal investimento e o Estado cria leis e institucionaliza a defesa dos que detém a mesma, assim como há uma burocracia que domina as ações humanas individuais, alijando como já disse a maioria da sociedade. Você pode me dizer que os trabalhadores ganham salários, e isso lhes garante o ganho econômico, mas isso não acontece, porque a eles só é distribuído o custo de sua mão de obra, relativo a venda de sua força de trabalho. O excedente de capital oriundo da venda dos produtos, é acumulado pelos investidores, para que os mesmos reinvistam na produção e mantenham para si mesmos grande parte dos resultados financeiros.
Como esse ganho econômico das organizações se reproduz? Primeiro com a instituição de uma racionalidade utilitária, que calcula as consequências de lucro a partir da redução de custos para obtenção de dos meios de produção, por isso que os salários não contém os lucros, e também pela produção intensiva e sempre crescente de produtos oferecidos ao mercado. Por isso que há alguns anos atrás falávamos com os outros pelo uso de um telefone fixo, hoje os temos ainda, contudo com mais alternativas para o mesmo fim, como celulares, smartphones, tablets, computadores, radiocomunicadores, canais de voz virtuais, etecetera. Essa proliferação de produtos para um mesmo fim, é o que chamei de intensiva e crescente oferta de produtos.
Além disso, esse ganho infinitamente crescente, se reproduz na massificação do consumo dos produtos. Esse efeito é produzido por uma indústria de comunicação de massa, que desenvolve através das mídias existentes, tais como, rádio, televisão, internet, entre muitas outras, mecanismos de convencimento das pessoas ao consumo. Um consumo cada vez maior, cada vez mais desenfreado, verdadeiramente enlouquecido. Quer um exemplo disso? Você usa uma calça para se vestir, como deve se vestir todos os dias, deveria ter pelo menos umas três calças certo? Pois bem, vá lá no seu armário e conte quantas calças tens. Se contou mais de três, isso se chama “consumo desenfreado”. Essas mídias que descrevi é que produziram esse efeito em você, em mim, em todos nós!
A Copa da Fifa tem exposto essa indústria de forma muito latente. Propagandas, garotos propaganda, sugestões de status, prazeres descritos ao consumir, são somente algumas das peripécias que nos fazem acreditar que para vivermos devemos consumir, depois consumir, e ainda consumir ... pra sempre e sempre consumir! Quanto você como trabalhador está ganhando efetivamente do produto de venda desse consumo? Quanto você acha que a costureira que alinhava as camisetas dos times que jogam na Copa da Fifa, levam desse ganho econômico? Reflita você sobre isso!
Outro ganho muito significativo é o ganho político. Esse ganho pode ser expresso pelo poder e dinheiro que políticos, profissionais ou não, obtém dos resultados das organizações econômicas. Vale lembrar aqui, que a política e a ação desenvolvida para cuidar dos cidadãos, nas cidades, nas comunidades, na sociedade em geral, enfim a política surgiu para cuidar de nossa vida, de nossas casas, enquanto nós desenvolvemos outras atividades vitais, que no caso é o trabalho, na sociedade que escolhemos viver.
Os políticos, com um evento como a Copa da Fifa, buscam promovê-lo nas comunidades em que tem ação. Com o sucesso de tal evento, ganham prestígio, ganham visibilidade, ganham votos, logo se mantém políticos, logo perpetuam-se no poder e dessa forma, no dito popular, podem se manter agarrados com força, nas “tetas do governo”! Sempre muito leitosas, sempre muito apetitosas!
Mas veja bem, não só o sucesso desses eventos produz ganhos. O insucesso deles também, porque dai, grupos contrários aos políticos eleitos, se aproveitam para tomar o seu lugar, criticando-os e responsabilizando-os pelo fracasso.
Sobre isso, podemos ver como os políticos nacionais estão se comportando quanto ao “legado da Copa da Fifa”. Obras foram prometidas e realizadas para as cidades, para o estado, para a nação, em função de estabelecer infraestrutura para receber a Copa da Fifa, estão sendo propagadas a quatro ventos, tais como os estádios, os aeroportos, os hotéis, as vias e aparelhos de mobilidade, etecetera. Políticos em todos os níveis tem ido a mídia e dito – Nós fizemos, nos construímos, nos viabilizamos, nós somos os “tais”. Em contrapartida as obras prometidas e não concluídas, ou sequer não iniciadas, são instrumentos para que outros políticos, de oposição aos que estão no poder, possam sair exaltando país a fora – Não fizeram, Não viabilizaram, desviaram verbas, enganaram a sociedade. Você consegue, vendo TV ou escutando rádio, identificar esses dois “tipos” de políticos? Pois então, eles existem as pencas! Eles existem aos borbotões. Com discursos tão hipócritas, que nos dá a impressão que não convencem nem a sim mesmos. A noticia ruim é que convencem! Não só a eles, mas a grande maioria de nós, que votamos em um ou em outro, e os mantemos no poder, em todos os níveis, garantindo a infinidade de seus ganhos. Percebe agora o que chamo de ganhos políticos? Mas porque votamos? É mais uma vez trabalho da indústria de comunicação de massas, que nos ilude, nos aliena, nos cega!
Mas espere, ganhos econômicos e políticos não são legítimos? Investidores e políticos não merecem se apropriar desses ganhos, se trabalham para isso, se desenvolvem seus papéis nessa estratégia de crescimento da sociedade? Minha opinião é que NÃO merecem! Minha opinião é que se apropriam do ganho de forma suja, ilícita, inescrupulosa. Minha opinião é que não ganham nada e sim ROUBAM tais ganhos! Exploram a grande maioria dos cidadãos envolvidos!!!!
Porque acho isso? Para isso preciso falar da terceira perspectiva de ganhos. Os ganhos da sociedade.
Você concorda que sociedade é o conjunto de todos os cidadãos? Dentre eles os investidores, os políticos, mas também o cidadão comum, fora das duas categorias iniciais, o trabalhador, o estudante, a dona de casa, os “alijados”!
(Cara!!!! To quase chorando de emoção aqui. Ao escrever isso olhei de lado e vi uma foto que tenho de meus três filhos, cidadãos dessa sociedade que falei, lembrei dos meus alunos, também cidadãos. Não chorei porque não tenho a capacidade de chorar fácil, como tem por exemplo os jogadores da seleção de nosso país. Acha que to sendo cínico né? Pois é, estou sendo mesmo)
Para falar dos ganhos da sociedade quero que façam um exercício. Vejam um “vídeo-tape” de uma partida dessas da Copa da Fifa. Veja se você consegue encontrar lá alguém que trabalha em supermercado, repondo produtos nas prateleiras, veja se vê alguém que consiga identificar como “pobre”, como falou a senhora que me encontrou no supermercado. Veja se lá há negros, mendigos, descamisados! Você não vai encontrar. Pode encontrar “Musas da Copa”, padrões de beleza impostos pela indústria de comunicação de massas, pode encontrar jovens e adultos, manuseando smartphones, postando felizes os resultados das partidas.
Na verdade, a sociedade em geral não ganha NADA com a Copa da Fifa, você não ganha, eu não ganho, ninguém que trabalha e estuda feito louco para sobreviver ganha! Há infinitas comprovações disso. Eu as vejo. Você a vê? Se não as vê, sorte sua, não sofrerá como eu e os “estranhados” ao sistema sofrem! Mas infelizmente, isso se converte também em azar. Azar de toda a sociedade. Por isso, me manifesto. NÃO assistindo os jogos da Seleção Brasileira na Copa da Fifa. É o que posso fazer nesse momento, é o que deixa tranquilo. É o que posso transferir para os meus!
(Se você encontra a senhora do mercado algum dia, espero que não pense como ela!)

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